segunda-feira, 22 de março de 2010

JUSTIÇA

O quadro era muito triste. Olhamos aquela mulher outra vez. E a mente rapidamente calculou os meses intermináveis que a detém ao leito de dores.

Contemplando-lhe o corpo minado pela enfermidade, o cansaço estampado na face, a memória que a trai a cada instante, com imensos lapsos de esquecimento do passado distante, quanto do ontem ainda presente, confrangeu-nos o coração.

Imaginamos a sua vida de trabalho e operosidade. Mulher dinâmica, valorosa, criou cinco filhos quase a sós. A profissão do esposo o mantinha semanas a fio longe do lar.

Sempre foi ela quem decidiu, opinou, escolheu. Disciplina lhe foi nota constante. Valor que passou aos cinco filhos. Disciplina de horários, na palavra, na conduta.

Dinâmica e corajosa enfrentou enfermidades dos filhos, dificuldades financeiras imensuráveis.

Os anos se somaram. Os filhos cresceram. Casaram e constituíram a própria família.

Vieram os netos e a soma de trabalhos não cessou, pois que agora os pequeninos lhe eram deixados à guarda, por horas, sim, desde que as forças já não eram as mesmas da juventude ativa e sadia.

E então, quando o inverno dos anos lhe cobriu de neve os cabelos, intensificaram-se as dores.

Morreram-lhe em curto espaço de anos, o esposo e três filhos, em circunstâncias abruptas e trágicas.

Feneceram-lhe as forças e o coração ferido se deixou desfalecer.

Acresceram-se as inquietudes e a doença se instalou, vigorosa.

Olhando-a agora, sobre a cama, semi-desfalecida, recordamos os esforços que fez para a preservação da vida dos filhos, pela sua educação.

Lembrando os anos de atividade e labuta, perguntamo-nos o porquê de tanto sofrimento.

As pessoas dizem que é o ciclo natural da vida. Nascer, crescer, enfermar, morrer.

Mas a pergunta não cala em nós. Desejamos resposta mais convincente.

Afinal, dói-nos na alma observar a debilidade e a dependência da mulher-mãe, esposa, avó.

Enquanto oramos por ela, soam-nos aos ouvidos as exortações do Evangelho de Jesus: “A cada um segundo as suas obras.”

É como se pudéssemos, no recesso do espírito, escutar a voz do cantor Galileu, em plena natureza.

Tornamos a olhar para o corpo da enferma e agradecemos a divindade. Podemos agora entender a sua serenidade na dor.

Ela sabe que é a justiça de Deus que a alcança, permitindo-lhe o resgate de faltas cometidas em dias passados, de existências anteriores.

Por isso ela sorri, ora, e espera. Aguarda os dias do reencontro com os seus amores, afirmando convicta: “Quando Deus quiser, hei de partir. E estou me esforçando para seguir viagem vitoriosa.”

* * *

Você sabia que ninguém sofre de forma injusta?

Se assim não fosse, não poderíamos conceber que Deus, nosso Pai, fosse infinitamente justo e bom, pois puniria a bel prazer uns e outros, concedendo felicidade a outros tantos.

Desta forma, cabe-nos cultivar a resignação ante os problemas que nos atingem e não podem ter seu curso alterado, por nossa vontade.

Contudo, é sempre bom lembrar que cada um de nós, sobre a Terra, pode se tornar instrumento da divindade, para aliviar a carga do seu irmão, socorrendo-o.

Eis porque a fraternidade é um dever de todos.

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